quarta-feira, 4 de março de 2015

5. Ser negra e bissexual

 
Ser bissexual, na minha opinião já não é uma tarefa das mais fáceis, imagine sendo mulher e negra então! Como mulher eu enfrento machismo e misoginia, o machismo até mesmo de algumas mulheres lésbicas, e ainda só pra completar o combo de discriminação, o racismo.  Não, isso NÃO É VITIMISMO, é uma REALIDADE!  Só pra começar, já se torna um pouco mais difícil encontrar relacionamentos fixos, porque enquanto bissexual, as lésbicas temem que eu as troque por um homem e já pressupõe isso de antemão, sem ao menos conhecer minha história de vida; os homens cis héteros me vêem como um mero objeto sexual, sendo negros ou brancos, principalmente se forem brancos, fora a questão do padrão de beleza supervalorizado que ainda é o eurocêntrico, onde as mulheres brancas, de cabelos mais lisos e traços “finos” ainda são as mais visadas por eles e também por algumas mulheres lésbicas e bissexuais.  Quantas vezes no meu “passado hetero” eu já não via só as gurias brancas ou de belos lisos com quem eu saía pras baladas serem as mais abordadas e eu não? Isso já diz muita coisa. Ia a psicólogos, fazia terapia, e sempre culpavam alguma outra característica minha, fosse no jeito de ser ou de me vestir.  E no geral, as pessoas tendem erroneamente a culpabilizar sua “falta de auto-estima”, mas como ter boa auto estima sendo deixada de lado por nada?  E eu ate tentava “mudar”, me produzir mais, ser um pouco mais séria, mas parecia inútil, nada mudava.  Mas por que só eu, com tanta gente no mundo cheia de defeitos, mas sempre rodeadas de gente pra namorar, tinha que mudar alguma coisa? Só por ser negra? Era como me dizerem que, “já que você nasceu com esse ‘defeito de fábrica’, deve agir ‘certo’ e fazer algo de proveitoso pra ‘superar’ esse fato e ser um pouco mais aceita”.  Mas isso não acontece só com negras, acontece também com as deficientes (especiais), gordas e garotas fora dos padrões de beleza em geral, normalmente são marginalizadas, desmoralizadas e desprezadas pelos homens héteros, como se toda mulher tivesse a obrigação de ser bonita pra atender as exigências e necessidades exclusivas deles!! Mas a pergunta é, por que alguém considerado fora do que a sociedade considera “normal”, certo, bonito, agradável, tem que se esforçar mais pra ser mais bonzinho, mais correto, e no final das contas, continua a ser desvalorizado? Que hipocrisia tão grande é essa que a sociedade tem mania de carregar e insiste em sustentar? Por que simplesmente não podemos ser nós mesmas, com nossos defeitos e desigualdades perante à sociedade? Ora! Nós só queremos ser livres, inclusive de padrões pré- estabelecidos de como se portar, caso sejamos as “coisinhas incomodas”. Porra! Será que já não é o suficiente, além de já ter de carregar essa cruz do preconceito e exclusão social, ainda sermos cobradas de como devemos ser e do que devemos ter, mas tudo isso...em vão?  As lésbicas não ficam muito atrás não, estão cada vez mais exigentes, querem mulheres não bissexuais, sem filhos ou sem o desejo de tê-los, mulheres lindas, magras, loiras...e tudo isso não é apenas por um gosto pessoal, mas sim por uma preocupação em denotar status social !   Quer dizer que se você é visto com alguém atraente, então se torna mais interessante. Se está com alguém abastado financeiramente, logo é visto como alguém importante.  No homem hétero sempre foi alimentada a ideia machista de que, pra ser o bom, tem que ter uma mulher gostosa do lado, pra mostrar pros amigos e pra família que ele é o  cara, e mesmo se  ela não for tão bela, tem que ser uma branca de cabelo lisinho e comprido. Tudo isso com a desculpa de querer “filhos mais saudáveis”, mas também tem a questão de querer “manter a linhagem”, manter a supremacia e permanência do que é considerado maioria, ou seja, dos indivíduos brancos, mesmo sabendo que no Brasil não há só pessoas brancas. Ficam pensando no que a família vai pensar dele com uma “negrinha”. Mesmo que ele consiga gostar dela, vai querer fazer bonito. Se ele curtir ficar até deixa rolar, mas jamais vai assumi-la oficialmente numa relação séria.  No blogueiras negras, muitas (héteros) reclamam não só de preterimento, mas também de relações abusivas e de regime de submissão quando estão com brancos, e até mesmo com alguns negros. Isso tudo leva à uma falta de opção (e boas opções), e elas acabam se submetendo a relacionamentos com homens que não desejam tanto só pra não ficar sozinhas, mas mesmo assim sentem aquela solidão, então com ou sem relacionamento e sendo como consequência um celibato (solteirice) imposto devido à falta de opção, se origina a solidão da mulher negra, pois os negros comparados à elas não tem tanto os mesmos problemas, pois alcançando um bom nível sócio-financeiro conseguem arranjar namoradas, brancas ou não.  Mas e as mulheres? Se não vão gerar filhos entre si, pra que querem apenas as brancas? Vaidade, talvez.  Vergonha de estar com uma negra , em alguns casos já pelo problema de se assumir como bi/lésbica, ainda ter que lidar com questionamentos por parte de uma família racista em potencial? Ninguém quer ter esse trabalho! Eu bem que gostaria de fazer parte deste nicho de “shiny happy people”, ou seja, as pessoas que atraem alguém (ou varias pessoas) facilmente por algum motivo, sem muito esforço, seja por uma bela aparência ou por alguma outra coisa que cative de imediato as pessoas. Há tempos vejo que só ser inteligente, divertida, amigável e interada não resolve, não é o suficiente. Você precisa ser “brilhante e feliz” (shiny happy people) o tempo todo, senão nem rola! Será sempre (e apenas) a ‘miguxa fofa’.  O problema não está em ser amiga, mas se resumir apenas à essa condição. Mas isso de atrair pessoas como “abelha no mel” é um dom, um fascínio, ou você nasce com ele ou não o tem. Não tem como adquiri-lo.  Mas na verdade o problema não é com você, e sim com a sociedade e o sistema, que fazem questão de tirar ou minimizar o “brilho natural” de algumas pessoas, em prol de manter o que é considerado maioria, superior, que pra elas é digno de ser sempre favorecido, e o “de baixo” sempre jogado pro lado, rebaixado.  Nada que não dê status ou não traga sucesso imediato deve ser tolerado. Algumas pessoas ainda acham que os bi e homossexuais não merecem direitos reconhecidos, nem ser favorecidos e logo não merecem nem respeito por achar que a maioria seja hétero, o que acho um grande equivoco. Errado! Todo mundo tem direito de ser quem é, mesmo que muitos não gostem!  Meu, se não gosta, não procura, mas para de querer ficar moldando o outro à sua maneira, porque “quem sabe assim de repente você goste um pouco”. Se não gosta e não se abrir pra isso, não vai gostar nunca! Então procure o que te faz feliz e deixa o outro em paz! Não faça dele/dela teu objeto de desprezo e projeção de inseguranças e frustração.  O nosso “pacote” é esse, é o que temos a oferecer, se tiverem que gostar da gente, será como somos, com nossas características, sejam boas ou ruins. Eu esperou dia poder sair dessa limitação criada e imposta pelas circunstâncias e encontrar alguém que goste de mim e me aceite verdadeiramente como eu sou, negra e bissexual.


Esse texto explica bem sobre o  sentimento de solidão da mulher negra, mesmo sendo voltado para o lado hétero, mas isso acontece em todos os meios: A cor da relação: Mulheres negras e as dificuldades com romances sérios

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